Morreu neste domingo (dia
13), aos 89 anos, em Lima, no Peru, o escritor Mario Vargas Llosa. Prémio Nobel
da Literatura em 2010 e "imortal" da Academia Francesa, o autor
peruano-espanhol propôs-se percorrer, nas páginas das suas obras, "um
horizonte mais vasto da experiência humana".
"Com profunda
dor, tornamos público que o nosso pai, Mario Vargas Llosa, faleceu hoje (13) em
Lima, rodeado pela sua família e em paz", escreveu Álvaro Vargas Llosa, filho do escritor, na
rede social X, em mensagem também reproduzida pela filha, Morgana.
"A sua partida
entristecerá os seus familiares, os seus amigos e os seus leitores em todo o
mundo, mas esperamos que encontrem consolo, como nós, no fato de ter tido uma
vida longa, múltipla e frutífera, e de deixar atrás de si uma obra que lhe
sobreviverá", lê-se no mesmo texto.

Na mensagem, indica-se
que o funeral decorrerá, nos próximos dias, "de acordo com as suas
instruções". Pelo que "não haverá cerimónia pública".
"A nossa mãe, os
nossos filhos e nós próprios confiamos que teremos espaço e privacidade para
nos despedirmos dele em família e na companhia dos seus amigos mais próximos.
Os seus desafios, como ele desejava, serão cremados".
Entre os maiores da literatura universal
Romancista, ensaísta,
articulista e professor universitário, Vargas Llosa inscreve o nome na história
da literatura como um dos mais influentes escritores latino-americanos.
A última obra, "Dedico-lhe o Meu Silêncio", foi publicada em outubro
de 2023 - a despedida formal da ficção. Daí a dois meses, aplicaria igualmente
um ponto final à assinatura de artigos na imprensa, nomeadamente à coluna
quinzenal "Pedra de toque", publicada desde o início dos anos de 1990
no diário El País.

"Estes artigos eram a demonstração da sua inesgotável curiosidade
intelectual e do seu afã por intervir em todos os debates sociais e políticos
da atualidade. Neles, como em alguns dos seus ensaios, aparecia esse
Vargas Lossa progressista no moral, mas neoliberal no económico que
desconcertava (e até irritava) os milhares de admiradores das suas novelas",
lê-se na edição online do jornal espanhol. Jorge Mario Pedro
Vargas Llosa nasceu em Arequipa, no Peru, a 28 de março de 1936.
Vargas Lllosa encetou o envolvimento público em causas políticas como apoiante
declarado de Fidel Castro e da revolução em Cuba. Transitou, em seguida, para a
apologia da democracia liberal, conservadora e capitalista. Em 1990,
candidatou-se à Presidência do Peru com o apoio de uma aliança de
centro-direita, tendo como adversário Alberto Fujimori.
Ao receber o Nobel da
Literatura, Vargas Llosa admitiu a dificuldade, para um escritor
latino-americano, de escapar à política, dado que o seu foi historicamente um
continente marcado por problemas sociais, cívicos e morais.

"A literatura latino-americana está impregnada de preocupações
políticas, que, em muitos casos, são mais preocupações morais",
clamava então, para contrapor: "Sou basicamente um escritor
e gostava de ser lembrado - se for lembrado - pela minha escrita e pelo meu
trabalho".
"Quando escrevo literatura, acho que as ideias políticas são
secundárias. Acho que a literatura compreende um horizonte mais vasto da
experiência humana", sustentaria. Ao galardoar Mario Vargas Llosa, a
Academia Sueca destacou, na obra do escritor, uma "cartografia das
estruturas do poder" com "imagens mordazes da resistência, revolta e
dos fracassos do indivíduo".
A somar ao Nobel da Literatura, Mario Vargas Llosa recebeu distinções como o
Prémio Rómulo Gallegos (1967), Princesa das Astúrias (1986), Planeta (1993),
Miguel de Cervantes (1994), Jerusalém (1995), National Book Critics Circle
Award (1997), PEN/Nabokov (2002) e Prémio Mundial Cino Del Duca (2008).
Sem ter escrito em francês, o escritor peruano-espanhol entrou, em fevereiro de
2023, para a centenária Academia Francesa, o primeiro escritor de língua
espanhola a figurar entre os "imortais" da instituição.

Vargas Llosa acumulou
também doutoramentos Honoris Causa atribuídos por
universidades da Europa, América e Ásia. Integrou ainda a Academia Peruana de
Línguas desde 1977, a Real Academia Española, a partir de 1994, e a Academia
Brasileira de Letras desde 2014.
Em Portugal, a obra de
Vargas Llosa tem atualmente a chancela da Quetzal, que publicou livros como
"Dedico-lhe o meu silêncio", "García Márquez - História de um
deicídio", "Conversas em Princeton", "Tempos duros", "O
apelo da tribo", "A civilização do espetáculo", "Cinco
esquinas", "O herói discreto", "O sonho do celta".

Antes disso, Vargas Llosa esteve no catálogo das Publicações Dom Quixote, que
editaram obras como "Conversa n`A Catedral", "A tia Júlia e o
escrevedor", "As travessuras da menina má", "Os contos da
peste", "A festa do chibo", "A guerra do fim do
mundo", "O falador", "Quem matou Palomino Molero?" e
"História de Mayta", além de "Duas solidões", que documenta
o diálogo literário de 1967 entre Gabriel García Márquez e Mario Vargas Llosa.
A obra de Vargas Llosa passou ainda, em solo português, pelas editoras
Publicações Europa-América - "A cidade dos cães" - e Quasi -
"Diário do Iraque", "Israel Palestina". A Presença publicou
"O barco das crianças", traduzido pelo poeta Vasco Gato.

"Devemos continuar a sonhar, lendo e escrevendo — a maneira mais eficaz
que encontrámos de aliviar a nossa condição perecível, de derrotar os estragos
do tempo e tornar o impossível possível", exortou o escritor em 2010.
Fonte: Carlos Santos
Neves – RTP