Hoje (22) é o último dia do Festival
Internacional de Literatura de São Paulo – Pauliceia Literária, que desde
quinta-feira vem sendo realizado na capital paulista, em uma iniciativa da
Associação dos Advogados de São Paulo (AASP), com debates, oficinas, bate-papo
e outras atividades, com a participação de mais de 30 autores brasileiros e estrangeiros.
Os eventos de ontem (21) contaram com escritores renomados. Além de Lygia
Fagundes Telles, a primeira deste sábado, subiram ao palco do Pauliceia
Literária as escritoras Ana Maria Machado e Beatriz Bracher, a advogada e
escritora Luiza Nagib Eluf e a jornalista Mona Dorf, mediadora do debate.
Para homenagearem a consagrada escritora, que compareceu ao evento, as
quatro mulheres levaram para a mesa suas obras preferidas de Lygia, das quais
selecionaram um trecho para ler para o público. Ana Maria Machado leu uma
passagem do conto A garota da boina,
do livro Disciplina do Amor. Venha
ver o pôr-do-sol foi
o conto lido por Eluf, que o extraiu do clássico de Lygia, “Antes do Baile
Verde”. Beatriz Bracher leu trechos do conto Apenas um saxofone.
As autoras discutiram o lugar feminino nas histórias de Lygia. “A
mulher sempre foi a protagonista da história, na maior parte de suas
narrativas, e não a coadjuvante, como geralmente acontece”, afirmou Eluf. Para
ela, as mulheres vivem cegas para a realidade patriarcal em que vivemos.
Ana Maria Machado, diretora da ABL – Academia Brasileira de Letras -,
vencedora do Prêmio Zaffari de literatura, de Passo Fundo, pelo seu último
romance, “Infâmia”, disse que, apesar dos contos ocuparem um lugar de destaque
na obra de Lygia, os seus romances, especialmente o título As
Meninas, estão entre
os livros mais fortes, belos, modernos da literatura universal do século XX. Na
escrita na Lygia, o que fascina é a ambiguidade de suas frases, em que não
sabemos o que é ficção, o que autobiográfico e memória.
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A escritora Lygia Fagundes Telles |
Lygia Fagundes Telles pediu o microfone para contar da sua emoção com
a homenagem de lhe dedicarem uma mesa, e, em um tom bem-humorado, repetiu uma
frase de seu filho: “Mãe, mulher pode chorar. Mas mulher nova, pois a mulher
mais velha chorando fica feia. Então vou tentar não chorar”, disse ela,
conversando de maneira descontraída com a plateia sobre histórias de sua vida.
A segunda mesa de sábado, “Brasil
de 1808 a
1889”, com
Laurentino Gomes, foi sobre a sua trilogia. Para conversar sobre a obra do
jornalista e escritor paranaense, foi convidado o editor de cultura do jornal O
Estado de S. Paulo, Ubiratan Brasil.
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Laurentino Gomes e sua trilogia |
O bate-papo foi uma aula de história. Laurentino contou alguns trechos
curiosos de seus livros e como é seu processo de pesquisa. Ele também fez um
paralelo entre sua antiga carreira e sua atual vocação: “Tanto o jornalista, quanto
o historiador estão atrás da verdade dos fatos. O jornalista é o historiador do
presente”, afirmou. E explicou que a visão do passado muda de acordo com o
momento que estamos vivendo. “Durante a ditadura, a história do Brasil era
contada de maneira épica porque isso interessava aos militares. Na
redemocratização, houve uma desconstrução dos heróis épicos”. Ao final,
Laurentino tirou dúvidas da plateia, que queria entender sobre as raízes da
corrupção no Brasil e de como ele lida com as críticas de acadêmicos.
Na mesa 10, Skakespeare e a Lei – O aspecto jurídico nas obras
de Shakespeare, o professor José Garcez Ghirardi e o escritor
Rodrigo Lacerda, dois especialistas em Shakespeare, fizeram leituras e
comentários sobre algumas obras do dramaturgo inglês, como O
mercador de Veneza, Rei Lear, e Romeu
e Julieta, apontando os aspectos jurídicos na obra do bardo.
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José Garcez Ghiradi |
Análises de alguns aspectos das peças A Comédia dos Erros e Macbeth complementaram as interpretações. Rodrigo
Lacerda iniciou a mesa lendo ensaio sobre a obra shakespeariana, para entender
e explicar como surgiu o grande interesse do público por assuntos jurídicos no
século 16.
O uso da linguagem jurídica, os litígios, os tribunais eram elementos
usados na era elisabetana pelos dramaturgos e por Shakespeare. “Eles escreviam
o que era de interesse do público. A estrutura jurídica, os oficiais judiciais
o ‘law mayer’, os xerifes, os contratos nupciais compunham o enredo das
histórias”, afirma Lacerda.
Garcez fez uma reinterpretação das obras do dramaturgo inglês para os
dias de hoje de hoje. Começou dizendo que a lei é uma forma usada para
beneficiar quem já está no poder. “Se ela serve como um instrumento de
dominação, logo pode ser injusta”, afirma.
Em sua análise sobre a peça Rei Lear, de 1603, Garcez fala do poder
do desejo de Edmund, um filho bastardo que luta para deixar de ser um homem
natural para ser tornar um homem político. Citando Maquiavel, Garcez faz uma
analogia à condição emocional do protagonista: “Se a (não) fortuna vai contra
você, abuse de sua virtude”.
“O filho bastardo estava condenado a não existir. Ele foi sim um
vilão, para conseguir aquilo que queria, mas o personagem expressa muito bem a
filosofia de Shakespeare”, assinala Lacerda.
Trechos de Romeu e Julieta e Rei Lear ilustraram a ideia apresentada por
Garcez em que a lei deveria encontrar um estatuto para o desejo: “Essa sempre
foi uma busca de Shakespeare, mostrar que mais do que se preocupar com os
preconceitos humanos, com o olhar de fora, externo, cada indivíduo deve encontrar
seu caminho, deve descobrir seu desejo”.
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O jornalista Edney Silvestre |
O sábado
continuou com Edney Silvestre, jornalista e escritor de “Vidas Provisórias”
(Intríseca), e Alberto Mussa, de “O Senhor do Lado Esquerdo” (Record),
convidados da conferência “Crime e memória – crimes reais e fictícios e seus
contextos históricos”, com medição do jornalista Flávio Moura. O debate focou
na gênese do romance policial e sobre como a realidade permeia as obras de
Edney e Mussa. Houve ainda a mesa “O Advogado do Diabo”, reunindo Antonio Cláudio
Mariz de Oliveira, Patrícia Melo e Luiz Eduardo Soares.
Programação deste domingo (22)
11h –
Pessoa Existe? - Jerónimo
Pizarro e José Paulo
Cavalcanti Filho
13h –
Ficção e Reportagem, Aqui e Acolá - Inês Pedrosa, Pedro Rosa Mendes e Michel
Laub.
15h –
Pauliceia Estilhaçada (livros
com São Paulo como cenário)
- Maria José Silveira, Marçal Aquino e Tony Bellotto.
17h –
Liberdade de Expressão - Noemi Jaffe e Zlata Filipovic
19h –
Meus Livros e Nada Mais: autores convidados leem trechos de seus livros
preferidos